Que oportunidades a Presidência Brasileira do G20 oferece para as bibliotecas e quais questões que são importantes para nós? Este texto foi publicado no Blog de Advocacy da IFLA e traz alguns insights a partir das prioridades já definidas. (Tradução: Jorge do Prado).
Em 01 de dezembro de 2023, o Brasil assumiu a presidência do G20, grupo constituído pelas 20 maiores economias do mundo que proporciona um espaço para discussão, coordenação e lançamento de iniciativas conjuntas. Os atuais países membros do G20 são Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia, Turquia e União Europeia, além de outros convidados que atuam como consultores ad hoc.
O G20 funciona em dois níveis de alta governança. Um reúne os representantes dos chefes de estado e de governo que supervisiona 15 grupos de trabalho, 2 forças tarefa e uma iniciativa-chave. E o outro nível é o financeiro, com os Ministros das Finanças (ou título equivalente) e presidências dos bancos centrais, que discutem questões econômicas fundamentais.
Em seu discurso no Summit do G20 realizado na Índia em setembro de 2023, o Presidente Lula sublinhou um forte foco na igualdade, em particular no combate à fome em todo o mundo, bem como na aceleração do desenvolvimento sustentável. Além disso, destacou-se uma necessidade de uma reforma das instituições financeiras internacionais.
Mas o que podem as bibliotecas esperar em diferentes áreas de atividades ao longo de 2024 e como podemos nos envolver como parte dos esforços mais amplos para garantir o reconhecimento e, consequentemente, o apoio? Este texto analisa algumas das áreas principais dos esforços do G20.
Economia Digital: o Grupo de Trabalho sobre Economia Digital caminha para seu quarto ano e centra-se em como aproveitar o potencial do digital para atingir objetivos políticos mais amplos. A Presidência brasileira definiu quatro temas: conectividade (em particular em áreas rurais e remotas), governo digital (inclusive por meio de serviços de governo eletrônico de alta igualdade e infraestrutura pública digital), integridade da informação (focada na ação de plataformas) e inteligência artificial (no intuito de adotar uma abordagem verdadeiramente global à IA e não apenas baseada na situação de um número limitado de países).
Há várias possibilidades para as bibliotecas, em particular em torno do acesso público nas bibliotecas como parte de uma infraestrutura de conectividade inclusiva mais ampla e em como elas podem apoiar a integridade da informação, desenvolvendo competências para navegar na web com qualidade. As bibliotecas também tem muito a contribuir para o funcionamento do governo eletrônico e para o debate sobre a infraestrutura pública digital (ver documento da IFLA). A reunião ministerial sobre este tema acontecerá em 14 de setembro.
Cultura: este também é o quarto ano de funcionamento do Grupo de Trabalho da Cultura, que reúne Ministros da Cultura. A existência do grupo de trabalho por si só já é útil, mostrando que a cultura tem o seu lugar como uma área de ação no contexto dos esforços para cumprir uma agenda política mais ampla. Durante a Presidência da Índia para o G20, a cultura recebeu um forte apoio como um objetivo de desenvolvimento.
Para 2024, com base no que foi trabalho sob a Presidência Indiana, a cultura inclui quatros aspectos: a diversidade cultural e a inclusão; cultura, ambiente digital e direitos autorais; cultura e desenvolvimento econômico sustentável e; preservação, salvaguarda e promoção do patrimônio cultural.
Para as bibliotecas, será uma oportunidade de se ampliar a afirmação do papel da cultura no desenvolvimento, bem como dos direitos autorais (incluindo os direitos de acesso à cultura), alinhado com o discurso do Presidente Lula. Um objetivo específico será o de ter uma definição mais ampla de cultura, incluindo, claro, bibliotecas, e não apenas o setor restrito de museus e de patrimônio. A reunião ministerial sobre essa pauta acontecerá em 18 de outubro.
Educação: o trabalho aqui em geral é fortemente focado nos profissionais da educação e em como ajudar os alunos a alcançarem seu potencial. As prioridades centram-se na resolução da escassez de pessoal, bem como na sua formação, diversidade e representação, além das oportunidades de intercâmbio e aprendizagem transfronteiriços. A Presidência também observa que estão na agenda questões relacionadas com a conectividade, as ferramentas digitais na sala de aula e na gestão escolar, a formação online e a adaptação dos currículos à tecnologia.
Para as bibliotecas uma prioridade será destacar o fato de que os bibliotecários e bibliotecárias devem ser considerados como profissionais da educação, como um papel fundamental no apoio à alfabetização e, de forma mais ampla, ajudando os alunos a terem sucesso. A nossa área também beneficiaria, sem dúvida, na inclusão de discussões mais amplas sobre aprendizagem ao longo da vida e pode oferecer muito para que a educação digital funcione de forma eficaz, respeitando ao mesmo tempo a privacidade. A reunião ministerial sobre esta pauta acontecerá nos dias 30 e 31 de outubro.
Pesquisa e Inovação: trata-se de um novo grupo de trabalho, criado pela Presidência Brasileira, tendo como objetivo principal a inovação aberta para o desenvolvimento justo e sustentável. É certo que se trata de mais acesso e transferência de tecnologia para países em desenvolvimento, com base na preocupação de que a tecnologia está muitas vezes ligada à concorrência entre países e não à colaboração para encontrar soluções. Além disso, o grupo de trabalho procura apoiar a mobilidade de estudantes e pesquisadores e permitir a colaboração internacional.
Para as bibliotecas, será útil não só ao garantir a compreensão do lugar das bibliotecas no centro das universidades e instituições de pesquisa, mas também sublinhar que a chave para promover o intercâmbio de ideias, a colaboração e as possibilidades é a difusão da ciência aberta. As lições do trabalho japonês do G7 sobre o tema em 2023 poderiam ser uma base. A reunião ministerial acontecerá nos dias 17 e 18 de setembro.
Um elemento interessante desse trabalho é a Iniciativa Bioeconomia, com um forte foco em como reunir e disseminar conhecimentos relevantes a fim de permitir uma utilização mais sustentável da biodiversidade e de compreender e maximizar o seu papel na promoção do desenvolvimento sustentável.
Desenvolvimento: as questões da agenda do Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento são a inclusão social e a redução das desigualdades, em particular, a garantia de que todos tenham acesso ao saneamento básico. Há também um apelo à cooperação entre grupos centrados no desenvolvimento e no financiamento a fim de aumentar os investimentos com o desenvolvimento sustentável.
A agenda do G20 para o desenvolvimento será provavelmente muito ampla, mas há potencial para destacar como a importância da equidade da informação pode ajudar a combater desigualdades ainda mais amplas. Existem também possibilidades ao demonstrar como as bibliotecas podem ajudar a difundir o conhecimento e a mudar comportamentos em torno do saneamento, para defender a inclusão de bibliotecas em planos e programas. Deveria haver, no contexto da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, espaço para discutir a necessidade de construir instituições comunitárias que ajudem as comunidades da forma mais eficaz possível. A reunião ministerial sobre este tema será em 23 de agosto.
Além dessas, há oportunidades potenciais em outras áreas. O foco do Grupo de Trabalho sobre Emprego é em manter as competências atualizadas (especialmente para mulheres e outras pessoas em risco de marginalização), em um momento de mudança tecnológica está bem relacionado com muito do trabalho desenvolvido pelas bibliotecas relativo às competências digitais e inclusão. Embora o novo Grupo de Trabalho para a Mobilização Global contra as Alterações Climáticas esteja mais centrado na economia e em ações mais amplas, será valioso destacar o apoio das bibliotecas à capacitação climática nas comunidades.
Da mesma forma, o Grupo de Trabalho para uma Aliança Global contra a Fome e a Pobreza trata extensivamente de melhorar o apoio e os incentivos fiscais, mas o papel das bibliotecas na partilha de inovação em comunidades rurais é relevante. As propostas inicias sobre saúde, centradas em sistemas unificados e resilientes, centram-se atualmente na coordenação e na colaboração, mas poderiam e deveriam incluir um direito universal de acesso à informação sobre saúde.
Por fim, existem outras áreas – turismo, empoderamento das mulheres e risco de catástrofes – onde há pouca informação disponível sobre os planos do G20, mas onde há espaço para o envolvimento das bibliotecas.
A IFLA e a FEBAB acompanharão o trabalho à medida que as discussões em torno dos diferentes grupos de envolvimento centrados em temas específicos das comunidades emergirão pela primeira vez de uma reunião de ‘Cúpula Social’, pouco antes do Summit em novembro. A lista de tais grupos inclui áreas relevantes para as bibliotecas, como a Urban20, o Civil20 (para sociedade civil) e o P20 (para os parlamentos).